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ARTIGO

Ciência, Evidência e a Ressurreição*

S. Joshua Swamidass|

22/03/2024

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S. Joshua Swamidass

É formado em biologia, possui mestrado e doutorado em Ciências da Computação pela University of California. Também possui formação médica (Medical Doctorate) pela mesma universidade. É professor e pesquisador na Washington University of Saint Louis.

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Como citar

Swamidass, S. Joshua. Ciência, Evidência e a Ressurreição. Unus Mundus, Belo Horizonte, n. 3, jan-jun, 2024.

A ciência é repleta de uma fé semelhante à confiança. Acreditamos em coisas grandiosas e contraintuitivas porque confiamos nos relatos de fontes fidedignas.

Massa é energia. O tempo desacelera com a gravidade e a aceleração. A Terra se move ao redor do Sol a cerca de 100.000 quilômetros por hora. Dois buracos negros se fundiram 1,3 bilhão de anos atrás, enviando ondas gravitacionais pelo espaço que em 2015 chegaram ao LIGO (Laser Interferometer Gravitational-Wave Observatory). Em princípio, tudo isso é reproduzível, mas apenas em princípio. Se tivéssemos de verificar e reproduzir pessoalmente cada experimento, a ciência pararia completamente. Sim, enfatizamos as evidências. Mas geralmente confiamos no consenso científico. Sim, somos céticos e desafiamos regularmente as teorias aceitas. Mas geralmente confiamos nos relatos de outros cientistas sobre o que observaram.

Sou cientista. Ainda assim, na Páscoa, celebro a ressurreição de Jesus que ocorreu há cerca de dois mil anos. Este evento, na Palestina do primeiro século, é a pedra fundamental de tudo. Minha fé na ressurreição, tal qual a confiança que tenho na ciência, encontra respaldo em sólidas evidências.

Sou cientista. Ainda assim, na Páscoa, celebro a ressurreição de Jesus que ocorreu há cerca de dois mil anos.

Quais são as evidências a partir das quais origina-se minha confiança na ressurreição? Um esboço breve e incompleto é apresentado aqui.¹ Estas evidências não são uma resposta, mas levantam a questão. Tudo o que precisamos é de curiosidade.

     1. Sem a ressurreição física de Jesus, dois mil anos de história ficariam a implorar por uma explicação, como um filme do qual foi retirada a sua cena-chave. Nenhum outro evento em toda a história registrada foi tão longe ao atravessar fronteiras nacionais, étnicas, religiosas, linguísticas, culturais, políticas e geográficas com tanta força. A mensagem se espalhou pelo mundo com um sucesso inexplicável. Durante os primeiros séculos, propagou-se sem dispor de poder político ou militar, resistindo aos esforços implacáveis de uma oposição dedicada, organizada e violenta. Como um pequeno grupo de judeus sem poder, em um território ocupado e insignificante da Roma antiga, conseguiu realizar este feito inigualável?² O que aconteceu há tantos anos que reformulou toda a história humana?

     2. Com datas confirmadas por análise radiométrica, profecias de séculos antes do nascimento de Jesus preveem sua vida, morte e ressurreição.³ O grande cientista Blaise Pascal identifica essas profecias como prova concreta para aqueles que buscam evidências da existência de Deus. Elas incluem detalhes específicos que Jesus e seus seguidores não poderiam controlar. Por exemplo, antes que os romanos inventassem a crucificação, o Salmo 22:16 descrevia a perfuração das mãos e pés de Jesus. Isaías 53 é uma profecia particularmente importante que narra a história de Jesus e o significado da ressurreição (Is 52:13-53:12). Seria isso evidência de uma inteligência fora do nosso tempo confirmando a autoridade de Jesus?

     3. Jesus foi uma pessoa real na história que morreu de fato. Diversos manuscritos de múltiplas fontes, incluindo historiadores judeus, descrevem um homem chamado Jesus que viveu e foi executado. Detalhes específicos relatados sobre sua execução confirmam o derramamento de “sangue e água” de uma ferida de lança em seu lado. Ele realmente morreu; não ficou apenas inconsciente.

     4. Os primeiros relatos da ressurreição e as profecias que a previam foram transmitidos de forma confiável ao longo da história. Em 2014, havia mais de 66.000 manuscritos antigos identificados, uma quantidade muito superior a qualquer outro texto antigo. Muitos deles foram datados por carbono como sendo de antes da época de Jesus e dos primeiros séculos posteriores. Vemos relatos praticamente inalterados nos manuscritos mais antigos. Um padrão de consistência emerge. Existem variações nos manuscritos, mas nada invalida a confiabilidade dos relatos da ressurreição.

     5. Os relatos da ressurreição incluem detalhes inconvenientes e pouco lisonjeiros, que fazem mais sentido como tentativas de registrar de forma confiável o que de fato aconteceu, sem enfeites. Esses detalhes não correspondem ao que se esperaria de um relato inventado. Por exemplo, as mulheres são as primeiras testemunhas da ressurreição. Em uma cultura que não aceitava o testemunho feminino como evidência válida em tribunais, esse detalhe é surpreendente. Da mesma forma, todos os discípulos, líderes da igreja primitiva, fogem como covardes quando Jesus é capturado.

     6. Após a morte violenta de Jesus, seus seguidores ficaram aterrorizados e se dispersaram. Então, algo aconteceu que fez brotar neles uma crença forte, audaciosa e confiante, capaz de resistir a uma oposição violenta e persistente. Ao contrário do que geralmente faziam outros movimentos que tiveram seus líderes executados, os discípulos, ao se reagruparem, não substituíram Jesus por um de seus familiares. A resistência deles foi inteiramente pacífica e desprovida de poder político. No entanto, todos subitamente estavam dispostos a morrer pelo que viram. O que os transformou? Por que não havia evidências na época que minasse a crença deles? O que os convenceu de que Jesus era incomparavelmente maior do que sua família?

     7. Mais do que apenas um fato do passado, a ressurreição cria uma conexão com Deus percebida por pessoas de todos os tempos, culturas, classes socioeconômicas, personalidades e capacidades mentais, ao longo dos últimos dois mil anos de história. Seu alcance inclui alguns dos cientistas mais renomados: Blaise Pascal, Johannes Kepler, Robert Boyle, Gregor Mendel, Asa Gray, Michael Faraday, James Clerk Maxwell, Santiago Ramón y Cajal e Francis Collins. Será esse alcance e influência incomparáveis um sinal de um Deus vivo operando seu propósito na história?

Mais do que apenas um fato do passado, a ressurreição cria uma conexão com Deus percebida por pessoas de todos os tempos, culturas, classes socioeconômicas, personalidades e capacidades mentais, ao longo dos últimos dois mil anos de história.

Algumas das evidências aqui apresentadas são comprovadas por métodos científicos. Por exemplo, a datação por radiocarbono demonstra que a predição de Isaías 53, de que Jesus “veria a luz da vida” após a morte, foi escrita pelo menos cem anos antes de seu nascimento. No entanto, a questão de Jesus nos convida gentilmente para irmos além dos limites da ciência, para uma realidade onde o amor, a beleza, a bondade e os relacionamentos são reais. Diante do questionamento sobre a tumba vazia, a própria ciência atinge seu limite. Ela aponta para algo além de si mesma.

     1. A ressurreição é uma ação direta e sobrenatural de Deus, um evento físico específico na história. A morte física, vista como definitiva tanto pela ciência moderna quanto pelo mundo antigo, serve para enfatizar a intervenção de Deus nesse momento. Como a ação divina não é considerada pelo campo científico, sequer podemos formular a questão sem abrir nossas mentes para coisas que estão além da ciência.[1]

     2. A fé cristã depende inteiramente da ressurreição física de Jesus (1 Coríntios 15:14,17). No entanto, nenhum “mecanismo de ressurreição” é proposto para a ciência estudar. Sendo um evento singular, sem mecanismo, que desafia todas as leis naturais, estamos [diante de algo] muito além da capacidade da ciência de julgar fatos e compreender evidências.

     3. A questão da ressurreição se assemelha mais a uma oportunidade de se apaixonar do que a uma investigação científica. Há evidências, mas a ressurreição não pode ser estudada desapaixonadamente.¹⁰[2] Se Jesus realmente ressuscitou, isso reordena tudo. Assim como se apaixonar, isso muda nossa visão de mundo.

O veredito final, para mim, é que a ressurreição ganha sentido através das lentes da história. Vejo o Criador de tudo o que a ciência estuda vindo até nós dessa forma. As evidências são convincentes, mas não definitivas. A fé em Jesus é fundamentada: com certeza, não é desprovida de evidências.

O veredito final, para mim, é que a ressurreição ganha sentido através das lentes da história. Vejo o Criador de tudo o que a ciência estuda vindo até nós dessa forma.

Assim, somos colocados diante de um convite. Iremos também nós crer? Seremos curiosos? Responderemos com confiança?

 

Os conteúdos das publicações da revista digital Unus Mundus são de inteira responsabilidade de seus autores e não refletem, necessariamente, a visão da Academia ABC².

* Este artigo, publicado aqui com autorização do autor, foi originalmente intitulado “Is There Evidence for Easter? A Scientist’s List” e publicado pela primeira vez na Páscoa de 2017, no website do The Veritas Forum, e novamente na Páscoa de 2018. Em seguida, foi incluído como um apêndice no livro The Genealogical Adam and Eve (2019), de S. Joshua Swamidass. Clique aqui para acessar o conteúdo original.

1. Recomendo meu ponto de entrada pessoal para esta conversa: Mais que um carpinteiro, de Josh McDowell. Outros relatos podem ser mais úteis para outras pessoas. Por exemplo, as explicações mais recentes de N. T. Wright sobre a ressurreição (Christian Origins and the Resurrection of Jesus: The Resurrection of Jesus as a Historical Problem), que ele expandiu no livro The Resurrection of the Son of God, foram convincentes para o filósofo Antony Flew antes de morrer, embora não seja claro que ele tenha confiado em Jesus. Da mesma forma, o argumento de C. S. Lewis favorável à ressurreição em Cristianismo Puro e Simples convenceu Francis Collins e outros cientistas, que responderam mais privadamente de forma semelhante aos pensamentos de C. S. Lewis. Agradeço a Sean McDowell por seus comentários úteis sobre esta lista.

2.The Christian Origins and the Resurrection of Jesus“, de Wright em 1998, é uma excelente exposição dessa ideia. Os próprios discípulos também previram esse impacto transformador mundial do evangelho (Atos 5:38-39).

3. Bonani et al., “Radiocarbon Dating of Fourteen Dead Sea Scrolls”, Radiocarbon 34 (1992):843-49.

4. Um bom estudo sobre isso é The Jesus Legend: A Case for the Reliability of the Synoptic Jesus Tradition, de Paul Eddy e Gregory Boyd (Grand Rapids: Baker Academic, 2007). Um trabalho relacionado é Did Jesus Exist? de Bart Ehrman (Nova York: HarperOne, 2013). Este último é de um autor agnóstico e não argumenta que Jesus é divino. Ainda assim o incluo aqui para demonstrar que a evidência de que Jesus existiu é tão forte que não precisamos partir de conexões cristãs para ver esta verdade.

5. O relato de sua morte explica “sangue e água” derramados de seu lado quando ele foi ferido (Jo 13,1–19,42). Este é um detalhe incomum e atípico da morte por qualquer meio, inclusive a crucificação. A “água” pode ser entendida pela medicina moderna como o resultado de um ferimento necessariamente fatal que liberou um líquido claro que se acumulou de forma anormal ao redor de seus pulmões ou coração (William D. Edwards, Wesley J. Gabel e Floyd E. Hosmer, “On the Physical Death of Jesus Christ”, JAMA 255 [1986]: 1455. Se não fosse para relatar com precisão o que foi visto em sua morte, não haveria razão para incluir este detalhe difícil de explicar sobre sua morte que só agora podemos entender.

6. A história real da Bíblia é mais interessante que a ficção. Às vezes é mais confuso do que imaginamos, mas um Deus que ressuscita Jesus dos mortos pode certamente preservar a sua mensagem para nós na história. Ao contrário dos relatos fictícios da história da Bíblia (por exemplo, O Código Da Vinci, de Dan Brown), Reinventing Jesus, de J. Ed Komoszewski (Grand Rapids: Kregel, 2006), cobre a historicidade de Jesus. “The Bibliographic Test” por Joshua McDowell e Clay Jones, 13 de agosto de 2014, fornece uma boa visão geral do manuscritos em questão, incluindo novas descobertas recentes.

7. The Fate of the Apostles: Examining the Martyrdom Accounts of the Closest Followers of Jesus, de Sean McDowell (London: Routledge, 2015), é o relato mais completo da confiança deles. Aparentemente, nem todos morreram pela sua fé, mas parece que todos estavam dispostos a morrer.

8. Para aqueles curiosos sobre a ciência, For the Glory of God: How Monotheism Led to Reformations, Science, Witch-Hunts, and the End of Slavery, de Rodney Stark (Princeton, NJ: Princeton University Press, 2003), explica a crença cristã entre os primeiros cientistas e seu papel fundamental na ciência. Até o “pai” da ciência moderna, Francis Bacon, era cristão e explicou no Novum Organum da teologia cristã que a ciência é um esforço para derrubar “ídolos” intelectuais.

9. Esta regra de evitar apelos à ação de Deus na ciência é muitas vezes referida como “naturalismo metodológico”, mas este é um nome impróprio. Esta regra foi firmemente estabelecida na ciência moderna durante centenas de anos e foi originalmente colocada na ciência por cristãos como Kepler, Bacon, Pascal e Boyle por razões teológicas. A sua concepção de ciência não estava enraizada no naturalismo, mas na sua fé como cristãos, portanto referir-se a esta regra como naturalismo metodológico, como se fosse um produto do naturalismo (e do ateísmo), não é correto.

10. Na verdade, os cristãos podem tentar corretamente o estudo desapaixonado no seu trabalho acadêmico; ver, por exemplo, Michael Licona, The Resurrection of Jesus: A New Historiographical Approach (Downers Grove, IL: InterVarsity Press, 2010).

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