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Quando e como primatas se tornaram pessoas humanas?*

Tiago Valentim Garros|

11/05/2023

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Tiago Valentim Garros

Mestre e Doutor em Teologia (EST), Licenciado em Ciências Biológicas (UFRGS). Bolsista Oxford-Templeton no Ian Ramsey Centre for Science and Religion da University of Oxford, UK, orientado pelo Prof. Alister McGrath e pelo Dr. Ignácio Silva. Coordenador do Theolab.

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Como citar

GARROS, Tiago Valentim. Quando e como primatas se tornaram pessoas humanas? Unus Mundus, Belo Horizonte, v. 1, n. 1, mar. 2023.

É arriscado mostrar a um homem com muita clareza quanto ele se parece com o animal, sem ao mesmo tempo lhe mostrar sua grandeza. Também é arriscado permitir-lhe uma visão muito clara de sua grandeza sem sua baixeza. É ainda mais arriscado deixar que permaneça ignorante das duas coisas. – Blaise Pascal

Introdução

Durante séculos, a questão do que significa “tornar-se humano” tem sido sujeita a debate teológico e filosófico, mas certamente, depois de Darwin, muitas novas dimensões foram adicionadas a essa discussão. A sugestão de que os seres humanos são apenas mais um ramo de uma imensa árvore da vida e que teve sua origem de antepassados semelhantes aos símios significou que devemos reinterpretar não apenas alguns textos bíblicos relacionados à Criação, mas toda uma tradição dogmática que toca assuntos importantes, como o pecado original, a culpa original, a singularidade humana, a alma e, claro, a doutrina da Imago Dei, isto é, a crença cristã de que os seres humanos foram feitos à imagem de Deus.

Da mesma forma, os desafios contemporâneos trazidos pela neurociência e neuropsicologia não ficam atrás no sentido de levantarem questões extremamente pertinentes, e às vezes problemáticas, para os entendimentos tradicionais da fé cristã com relação à antropologia. Francis Crick, codescobridor da estrutura do DNA, famosamente afirmou:

Suas alegrias e suas dores, suas memórias e ambições, seu senso de identidade pessoal e livre arbítrio não são mais do que o comportamento de um vasto arranjo de células nervosas e suas moléculas associadas. [...] Você não é nada além de um pacote de neurônios.¹

Para Crick, a ciência resolveu a questão do ser humano de forma simples e definitiva. Somos máquinas biológicas controladas pelos nossos genes, e noções como alma/espírito, e até a própria mente e a consciência são ilusórias. Mas será mesmo assim? Qual o lugar de uma discussão teológica sobre o ser humano no contexto das ciências naturais? Há lugar para falar em alma, imagem de Deus, mente e consciência – fatores que historicamente foram apontados como a “diferença” humana em relação aos animais?

Nosso objetivo aqui é analisar algumas ideias propostas na literatura sobre como relacionar os recentes achados da evolução humana e da neurociência com questões tão importantes teologicamente. Começaremos examinando as origens humanas e a dificuldade em definir a humanidade biologicamente. Discutiremos a questão mente-alma-corpo, trazendo uma ideia cientificamente compatível de entender a alma e a Imago Dei. Concluiremos que a humanidade pode ser entendida como uma propriedade emergente do processo evolutivo, assim como a mente humana emerge da constituição física do cérebro. Cabe ressaltar que o que faremos aqui se trata de um voo bastante panorâmico sobre esses temas, cujo objetivo maior é abrir um canal de diálogo possível entre as ciências naturais e a teologia, e não necessariamente pontificar sobre esses temas.²

Para Crick, a ciência resolveu a questão do ser humano de forma simples e definitiva. Somos máquinas biológicas controladas pelos nossos genes, e noções como alma/espírito, e até a própria mente e a consciência são ilusórias. Mas será mesmo assim?

Humanidade e evolução³

O problema começa quando tentamos definir o que é um humano segundo uma perspectiva biológica comparada. Os primeiros taxonomistas, que não tinham acesso a nenhum fóssil hominídeo, já estavam espantados com nossas semelhanças com outros macacos vivos.⁴ A descoberta de fósseis de seres que pareciam “diferentes” dos humanos modernos, mesmo antes de Darwin, forçou os biólogos a formular hipóteses sobre suas relações com os humanos modernos. Com os progressivos avanços na genética (como o sequenciamento do genoma humano) e a contínua descoberta de mais fósseis (como os H. naledi em 2013), a árvore genealógica tem sido continuamente remodelada, e ainda há muito desacordo.⁵ A evidência genética, no entanto, é clara ao mostrar que humanos modernos compartilham um ancestral comum com os chimpanzés que viveu há cerca de 6 milhões de anos. Nossa linhagem evolutiva se dividiu várias vezes, dando origem a várias espécies, incluindo o Homo sapiens e o H. neanderthalensis, com forte evidência genética sugerindo cruzamento entre eles.⁶ (Veja a figura 1 para uma relação proposta entre essas várias espécies).

Para complicar ainda mais a questão, podemos chamar todas essas espécies de “humanas”? Brooks contribui:

Todos os membros do gênero Homo são mesmo humanos? [...] Será que ele começa com os primeiros sinais de aumento do cérebro nos fósseis etíopes e quenianos de 2,3 milhões de anos atrás ou apenas com o primeiro indivíduo com um cérebro maior, dentes menores, tamanho corporal moderno e proporções de membros modernos encontrados no Quênia há 1,5 milhões de anos atrás? Deveríamos limitar a definição de "plenamente humano" somente aos membros da espécie sapiens, definida morfologicamente [...]?⁷

Figura 1- Relacionamento proposto para fósseis de hominíneos.⁸ 

Cientificamente falando, a resposta a essas perguntas tem sido “localizar” a humanidade não em aspectos morfológicos, mas comportamentais. Berry e Jeeves fizeram uma revisão bibliográfica deste assunto.

É incerto quando a humanidade (seja como for definida) surgiu pela primeira vez. Reivindicações foram feitas de que o surgimento da humanidade é demonstrado por [1] enterros formalizados, implicando uma crença na vida após a morte; [2] contas e ornamentos corporais; [3] pinturas em cavernas; ou [4] pelas origens da agricultura e da domesticação animal. McBrearty e Brooks (2000) apresentam evidências de que muitos dos componentes da "humanidade" podem ser reconhecidos no registro arqueológico africano de 40.000 a 50.000 anos atrás (ferramentas de pedra, caça especializada, uso de recursos aquáticos, comércio de longa distância, arte e decoração). Eles argumentam que sua origem se espalha por um longo período.⁹

Podemos dizer que o consenso científico é que esses comportamentos surgiram por intermédio de um processo gradual, e não subitamente. Brooks afirma que “as capacidades para algumas das qualidades mais humanas: criatividade, empatia, reverência, espiritualidade, apreciação estética, pensamento abstrato e resolução de problemas (racionalidade) já eram evidentes logo após o surgimento de nossa espécie”,¹⁰ e que “quanto mais sabemos, mais difícil é traçar uma linha entre humano e não humano ou pré-humano”.

Ainda assim, sabe-se que o aumento substancial do córtex cerebral em determinado momento permitiu o aparecimento de uma complexa gama de comportamentos e características de ordem superior. Francisco Ayala, importante biólogo evolutivo e cristão, acredita que o principal resultado desse aumento foi o desenvolvimento cultural,¹¹ o que possibilitou o surgimento de diversas faculdades intelectuais, para ele cruciais para definirmos “humanidade”: o pensamento abstrato, a linguagem simbólica, o raciocínio, a complexa organização societária que permite o desenvolvimento das artes e da ciência, e, principalmente, o senso moral.¹² 

Várias dessas características tidas como distintivamente humanas referem-se a aspectos psicológicos que exigem uma “teoria da mente”, que envolve a capacidade de se comportar tendo em mente as intenções ocultas de outro ser, e não apenas responder ao comportamento observável. Assim, somente os seres humanos teriam uma “vida da mente”, que nos permitiria ter criatividade, empatia, reverência, espiritualidade, apreciação estética, pensamento abstrato e capacidade de resolução de problemas. No entanto, Brooks aponta que, para cada caso, pelo menos um dos grandes primatas atuais (dentre outros animais também) tem mostrado um certo grau dessas características que não permitiria uma distinção absoluta entre humanos e outros animais.¹³

Mesmo a cultura, outrora tida como exclusividade do Homo sapiens, foi demonstrada existir, embora rudimentar, nos orangotangos e nos chimpanzés, que transmitem às gerações subsequentes informação não genética sobre comportamento.¹⁴ O mesmo ocorre com a linguagem, destacada como crucial para o surgimento e predomínio de nossa espécie frente aos neandertais, que aparece em formas rudimentares em outros animais.¹⁵

Mesmo a cultura, outrora tida como exclusividade do Homo sapiens, foi demonstrada existir, embora rudimentar, nos orangotangos e nos chimpanzés, que transmitem às gerações subsequentes informação não genética sobre comportamento.

Todas essas semelhanças, características compartilhadas e dificuldades de traçar uma linha nítida entre os humanos e outros símios levaram ao que tem sido chamado de “nothing buttery“, isto é, a típica declaração reducionista de que os humanos são “nothing but…” —  humanos são apenas… “macacos glorificados”, nesse caso. Por outro lado, teólogos também foram acusados ​​de recorrer à ciência para resolver questões teológicas, como tentar encontrar em estudos comportamentais, por exemplo, algum tipo de evidência que corroboraria uma reivindicação pretensiosa de singularidade que satisfizesse um ponto de vista teológico, tal qual os seres humanos como a “coroa da criação”.

Assim, podemos observar um estreitamento generalizado da diferença entre humanos e outros primatas, como a famosa primatologista Jane Goodall vem defendendo há décadas. Mas devemos nos preocupar com isso? Há algum problema teológico com essa aparente falta de singularidade?

A controvérsia Mente-Corpo-Alma

Por muito tempo, essa suposta singularidade humana era creditada à posse de uma “alma”, que é geralmente identificada com noções de racionalidade, consciência, capacidade espiritual e interioridade. Bibliotecas já foram preenchidas sobre o tema de “o que seria a nossa natureza essencial”, se bipartida (corpo e alma) ou tripartida (corpo, alma e espírito).¹⁶ A teologia cristã foi fortemente influenciada pela noção agostiniana de seres humanos como almas racionais usando um corpo mortal e material, e uma separação entre uma entidade material – o corpo – e uma ou duas imateriais – a alma/espírito – tornou-se ortodoxia cristã.

No entanto, segundo Brown e Jeeves, se torna cada vez mais difícil manter essa visão sobre a pessoa humana no mundo da neurociência e neuropsicologia atual. Com isso, o indivíduo parece se ver preso a um dilema, tendo que escolher entre duas proposições: 1) somos seres físicos que também possuem alma imaterial, e é por meio dela que podemos experimentar e nos relacionar com Deus; 2)  somos seres neurobiológicos cuja mente (também a alma, a experiência religiosa etc.) pode, em teoria, ser exaustivamente explicada pela neuroquímica e, em última análise, pela física.¹⁷

A segunda proposição tem a clássica marca do materialismo reducionista típica de muitos cientistas  que costuma causar aversão às pessoas de fé, pois toda a vida da mente e a experiência religiosa acaba sendo considerada um mero epifenômeno de moléculas em movimento que obedecem às leis da física. Tal abordagem é chamada de fisicalismo (ou “fisicismo”) reducionista, num clássico exemplo do nothing buttery de que falamos algumas linhas antes (e que se apresenta enfraquecido cada vez mais com os avanços das ciências cognitivas, da inteligência artificial e da robótica).  Por outro lado, a primeira proposição contém a clássica distinção corpo/alma, em que a mente ou alma seria uma dimensão imaterial com poder agente que, de alguma forma, interagiria com o corpo físico. 

Brown e Jeeves defendem que esse dualismo corpo/alma carece de respostas satisfatórias para dois problemas críticos: 1) a natureza desta interação corpo-alma não é especificada; 2) há cada vez menos funções superiores humanas que não possuem correlatos neurocognitivos já demonstrados e que poderiam, em tese, fortalecer a evidência em favor de uma alma imaterial.¹⁸

Segundo essa visão dicotômica, para que o conceito de alma tivesse substância, dever-se-ia encontrar alguma evidência de algum campo de agência dentro das atividades mentais e físicas dos seres humanos que não tivesse correlatos neurocognitivos. No entanto, a evidência empírica disponível aponta em outra direção. Por exemplo, se pensarmos em uma lista de coisas que a Escritura cristã considera atributos da alma, como o livre arbítrio, o pecado, a experiência de culpa, da graça, da justiça e do comportamento ético,  o culto e uma “vida no espírito” interior, a capacidade de compreender e responder à revelação de Deus, a capacidade de amar, dentre muitas outras, todos esses atributos são conhecidamente influenciados ou determinados fortemente pelas funções e propriedades dos vários sistemas neurobiológicos. Brown e Jeeves, dessa forma, perguntam: 

Como ficam os sentimentos de proximidade de Deus e êxtase espiritual quando podem ser sabidamente provocados por convulsões que afetam o lobo temporal? O que fazer da experiência do amor e do relacionamento interpessoal quando, na síndrome de Capgrass, uma pessoa crê firmemente que sua família e amigos próximos são impostores que estão disfarçados de sua família e amigos, o que sugere uma incapacidade de juntar o reconhecimento com o sentimento de familiaridade necessário para o amor? O que fazer da completa falta de refreio moral no comportamento de pessoas com lesões no lobo frontal, ou nas dramáticas mudanças nas vidas religiosas e espirituais de pacientes com a demência de Alzheimer?¹⁹

Parece não haver área da experiência de comportamento humano sobre a qual mudanças no cérebro não gerem nenhum tipo de efeito, o que, se houvesse, indicaria uma agência independente e imaterial que não está sujeita a alterações físicas. Por causa disso, há um certo consenso científico de que o fisicalismo venceu sobre o dualismo clássico.²⁰ Por isso, não é raro ver cientistas concluindo, como Hobson, que “toda evidência disponível é que a consciência, incluindo o que poderíamos chamar de espírito ou alma, é uma função cerebral”.²¹ Murphy comenta, afirmando que “muitos [cristãos], no entanto, relutam em aceitar os relatos fisicalistas da pessoa, porque muitas vezes parecem negar a existência, o significado ou o valor daqueles aspectos da vida humana que consideramos mais caros”.²² Ademais, ao negar a existência de uma alma imaterial, aquilo que era considerado o “assento de Deus” para se relacionar  com a humanidade aparentemente se perde. Os relatos fisicalistas tendem a soar reducionistas ao extremo e incompatíveis com a fé cristã. 

Parece não haver área da experiência de comportamento humano sobre a qual mudanças no cérebro não gerem nenhum tipo de efeito, o que, se houvesse, indicaria uma agência independente e imaterial que não está sujeita a alterações físicas.

No entanto, Jeeves mostra que não há necessidade de ser assim. Ele lembra que no clássico A base física da mente (1950) os diversos cientistas que contribuíram com o volume concordaram que a atividade neural do cérebro de alguma forma interage com o mundo privado da mente, mas deixaram em aberto a questão do dualismo. Hoje em dia, o consenso crescente é de que a abordagem mais frutífera é tratar a atividade mental como incorporada na atividade cerebral em vez de resultar dela ou ser idêntica a ela. Ou seja, “considerar a atividade mental e a correlata atividade cerebral como aspectos internos e externos do mesmo complexo de eventos que constituem a agência humana consciente”. Segundo Jeeves:

O que precisa ser explicado é como os correlatos físicos de eventos mentais particulares têm os efeitos que têm em termos das leis da biofísica, bioquímica e neuropsicologia. O perigo é misturar nossas categorias de diferentes níveis quando tentamos traçar cadeias científicas de causalidade.²³

Não é necessário, segundo Jeeves, cair numa abordagem fisicalista reducionista, que reduz as explicações da mente/alma à meras descrições de fenômenos físico-químicos, tampouco resgatar noções dualistas de uma entidade imaterial X material.²⁴ Berry, Jeeves, Brown e Murphy preferem entender os seres humanos como uma unidade psicofísica (ou psicobiológica), abordagem que chamam de monismo de aspecto dual:

Ao dizer "de aspecto dual", afirmo que, para fazer justiça à natureza dessa realidade, é preciso dar pelo menos duas explicações dela: uma explicação do ponto de vista da sua constituição física e uma explicação do ponto de vista das suas capacidades mentais ou cognitivas. Não se pode reduzir uma à outra.²⁵

Temos aqui uma tentativa de responder ao problema mente-alma-corpo que seja compatível tanto com os achados da neurociência como com um teísmo cristão robusto, o que os autores chamam de fisicalismo não reducionista” (ou “não redutor”):²⁶

O "fisicalismo" refere-se ao pressuposto de que não é necessário postular uma segunda entidade metafísica, a alma ou a mente, para explicar as capacidades humanas e sua distinção. A alma (mente) é fisicamente incorporada. No entanto, uma versão "não redutora" do fisicalismo pressupõe que o comportamento humano não pode ser exaustivamente explicado pela análise em níveis inferiores (neurobiologia). Explicações de nível mais elevado supervêm aos níveis mais baixos.²⁷

Fundamental para a compreensão dessa noção são os conceitos atualmente bastante em voga da “emergência”, da “causação descendente/ascendente” (ou “causação top-down/bottom-up”) e também da “superveniência”. Segundo Jeeves, esses conceitos, juntos, “oferecem uma imagem cientificamente plausível de como processos mentais e capacidade de ações morais podem continuar sendo as causas reais do comportamento, embora incorporadas no sistema físico/biológico.”²⁸

Esses termos, que exigiriam um trabalho bem mais amplo para discuti-los com propriedade,²⁹ referem-se a níveis de causação a que são sujeitos os sistemas físicos que parecem transcender o determinismo das leis atômicas. Eles representam a capacidade de níveis mais altos de organização da realidade terem poderes causais em níveis inferiores, o que é ubíquo na física, química e biologia.³⁰ As propriedades emergentes referem-se à maneira como entidades complexas, como os sistemas biológicos, por exemplo, exibem comportamentos e fenômenos que não podem ser previstos, descritos ou adequadamente explicados com base na operação de processos inferiores, como processos moleculares ou atômicos. Tais propriedades “emergem” em níveis superiores de organização e complexidade. O próprio conceito de “vida” é tido como uma propriedade emergente permitida por causações top-down em sintonia com “bottom-up”. Para ilustrar, Jeeves usa o exemplo de um organismo unicelular simples, como o protozoário conhecido como ameba, que exibe uma organização complexa de moléculas e propriedades “que não existem nas próprias moléculas”. O comportamento da ameba “depende do estado atual da organização das moléculas, e não das próprias moléculas. Nesse sentido, a atividade da ameba é um exemplo de propriedade emergente”.³¹

No campo da teoria de sistemas dinâmicos, vemos como novas propriedades causais podem emergir de sistemas complexos caracterizados por alto índice de interações não lineares de seus elementos. Um bom exemplo de tal sistema é o córtex cerebral humano, aquele cujo desenvolvimento, segundo Ayala, foi fundamental para o surgimento das características que julga serem distintamente humanas. Segundo Jeeves, “os elementos da neurobiologia humana na forma do córtex cerebral produzem as propriedades cognitivas da pessoa inteira”. No entanto, modelos matemáticos de sistemas dinâmicos mostram que as replicações do mesmo modelo de sistema não exibem as mesmas características e propriedades do sistema original. Ou seja, se colocarmos os mesmos neurônios, nos mesmos lugares, submetidos às exatas mesmas circunstâncias, não teremos os mesmos padrões de comportamentos – não teremos a mesma pessoa. “O cérebro físico produz propriedades emergentes inexplicáveis do ponto de vista das leis da física, química e mesmo dos neurônios”.³² Tais propriedades exercem influência nos próprios padrões dinâmicos do sistema neural, e esses padrões causam efeitos top-down nos fenômenos fisiológicos de nível inferior, que são o próprio substrato das atividades dos sistemas superiores. 

Murphy comenta que as descrições e explicações formuladas em um nível superior (por exemplo, consciência humana) podem ser vistas como supervenientes³³ sobre explicações de nível inferior, embora presumam a necessidade de operação de processos em um nível mais baixo.³⁴ Dessa forma, comportamentos e explicações mentais relacionados com o conceito de “alma” ou “mente” – tais como crer, pensar, lembrar, seriam adequados filosoficamente porque supervêm de explicações de níveis inferiores, mas aqueles não podem ser reduzidos a estes. Ademais, essas atividades mentais exercem causação top-down, alterando o próprio sistema de padrões que as tornaram possíveis. 

Ayala exemplifica, referindo-se às habilidades superiores que para ele são distintamente humanas:

os processos de desenvolvimento cultural [o pensamento abstrato, a linguagem simbólica etc.] transcenderam de forma tal a evolução biológica que lhes permitiu surgirem, que se torna impossível imaginar a cultura humana como sendo nada mais do que apenas neurobiologia geneticamente determinada. A cultura humana é promovida e facilitada pelas funções aprimoradas do cérebro físico, mas não pode ser reduzida ao funcionamento desses processos físicos subtraindo-se todo o restante.³⁵

Podemos ver que, para Ayala, o desenvolvimento cultural humano é uma propriedade emergente do processo evolutivo de um sistema complexo (além de um agente de causação top-down), com bases neurobiológicas, mas que não pode simplesmente ser reduzido a elas.

Nesse sentido, Jeeves conclui que:

a descrição da mente-cérebro do ponto de vista de suas propriedades físicas é compatível com a descrição do mesmo sistema do ponto de vista de conceitos mentais como pensar, crer e lembrar. Ambos os níveis de descrição são necessários para explicar plenamente todo o sistema incrivelmente complexo. [...] os próprios termos com que conseguimos debater e discutir estes assuntos são em si propriedades emergentes do sistema completo. Sem tais ferramentas conceituais mentais de nível superior, não podemos sequer falar e discutir sobre estes assuntos e, nesse sentido, qualquer tentativa de reduzi-los a conversa furada de neurônios que interagem entre si os esvazia de imediato de toda lógica e sentido.³⁶

Assim, o fisicalismo não reducionista, que engloba essas ideias de emergência, causação top-down e superveniência, seria uma forma cientificamente robusta, filosoficamente defensável e teologicamente aceitável de descrição das relações mente-corpo segundo esses autores.³⁷ A mente humana e seus fenômenos associados seriam fenômenos emergentes dos processos físicos que regem o funcionamento do cérebro humano. 

Porém, uma pergunta se faz necessária neste momento. Com essa aparente rejeição do dualismo clássico, como fica a antropologia cristã? O dualismo corpo/alma é realmente parte necessária de um cristianismo biblicamente centrado e de uma antropologia teológica cristã?

A mente humana e seus fenômenos associados seriam fenômenos emergentes dos processos físicos que regem o funcionamento do cérebro humano.

Como entender a alma?

O apelo cristão a uma noção dualista parece surgir da Escritura, onde a palavra nephesh é frequentemente traduzida como alma. Ademais, essa alma é frequentemente identificada como “a diferença humana” com relação ao restante da criação. No entanto, estudiosos bíblicos nos advertem que essa visão é mais uma herança histórica do que realmente presente nas Escrituras. Em Gênesis 2:7 (“O Senhor Deus formou o ser humano do pó da terra, soprou em suas narinas o fôlego da vida, e o ser humano tornou-se alma vivente”),

Não devemos imaginar que o fato de Adão ter recebido alguma essência especial intangível o torna humano, distinto dos animais e apto para a vida eterna. O nephesh aqui não é uma posse, nem um componente da natureza de Adão – uma parte. O monte de pó, ao receber o sopro divino tornou-se, na realidade, um nephesh vivente. Esta expressão, então, indica a totalidade do ser de Adão. Adão não TEM um nephesh; ele É um nephesh vivente.³⁸

Além disso, nos versículos anteriores a Gênesis 2:7, o termo refere-se claramente aos animais – cada um é um nephesh vivente, não sendo, portanto, uma entidade espiritual intangível que determina a identidade dos seres humanos, como muitas vezes o termo alma sugere. 

Murphy conclui que os autores bíblicos não estavam preocupados em definir quais seriam as partes “essenciais” de que é formada a natureza humana – interesse típico dos filósofos gregos:

[...] os autores bíblicos estavam interessados em um relato "aspectivo". Aqui, cada "parte" representa a pessoa inteira pensada de um certo ângulo (Dunn, 1998). Assim, por exemplo, "espírito" significa toda a pessoa em relação a Deus. O que os autores do Novo Testamento estão interessados, então, são os seres humanos em relação ao mundo, uns aos outros e a Deus. A distinção de Paulo entre espírito e carne não é nossa distinção posterior entre alma e corpo. Paulo está preocupado com dois modos de viver: um em conformidade com o Espírito de Deus, e outro em conformidade com a velha era antes de Cristo.³⁹

Joel Green complementa dizendo que “Gênesis não define a humanidade em termos essencialistas, mas em termos relacionais – mais especificamente identificando a pessoa humana como parceiro de Yahweh.”⁴⁰

Sendo assim, parece incorreto, mesmo biblicamente, atribuir a diferença humana à “posse” de uma alma, ou mesmo ver na alma alguma resposta a “o que seria a essência humana”. Mas o que fazer, então, com as funções e propriedades que são atribuídas pela Bíblia à alma?

Segundo Brown, a alma humana deve ser entendida à luz dos estudos contemporâneos como uma “capacidade para um âmbito particular de experiência ao invés de uma essência não física habitando o corpo”.⁴¹ Os atributos normalmente apontados como “coisas da alma” têm a ver de modo fundamental com a capacidade e a experiência de relacionalidade pessoal, que, por sua vez, emerge por intermédio  da “operação interativa de uma teia de habilidades cognitivas fundamentais”, já presente em primatas inferiores mas marcadamente mais pronunciada em humanos.

Alma é a música feita por um conjunto de músicos (as várias habilidades cognitivas de nível inferior) que tocam em conjunto para criar as capacidades para o diálogo interpessoal, bem como o autoconhecimento e a autorreflexão interna (experiências intrapessoais). Executada em relação a um Deus que escolhe estar em diálogo com as suas criaturas humanas, a capacidade cognitiva para a relacionalidade pessoal incorpora [corporifica] a espiritualidade.⁴²

Essas habilidades para uma relacionalidade pessoal têm sido identificadas, dentre outras, com

a linguagem (a capacidade de comunicar uma infinidade potencial de proposições), uma teoria da mente (a habilidade de considerar o que seja mais provável que o outro está pensando ou sentindo), a memória episódica (uma memória histórica consciente de eventos, pessoas, tempos e lugares, mais do que a simples memória de atos e suas consequências), uma orientação futura (a habilidade de projetar cenários mentais de implicações futuras de comportamentos e de eventos) e uma modulação mental executada por um complexo sistema cognitivo social e contextual que serve de guia para o comportamento em curso e a tomada de decisões.⁴³

Tais habilidades, segundo essa compreensão, seriam o substrato sobre o qual os atributos associados à relacionalidade pessoal se constroem. Elas representam habilidades cognitivas presentes em outros animais, sem dúvida, porém em nível bastante mais pronunciado em humanos, o que proporciona uma riqueza e frutificação sem paralelo no mundo natural. Isso pode não significar uma diferença de singularidade qualitativa entre humanos e outros primatas, mas sim uma diferença quantitativamente substancial. A humanidade, nesse caso, seria vista não como o “pináculo” da criação, mas, segundo ilustração de Fraser Watts, a “dobradiça” da criação, ou seja, o momento em que o mundo natural, que tem sua origem em Deus, produziu um conjunto de sistemas (as “qualidades da alma”) que possibilitaram que houvesse um relacionamento explícito com Deus.⁴⁴

É interessante notar, portanto, que não é necessário abandonar a noção teológica de alma em favor de uma perspectiva fisicalista reducionista. O que a teologia clássica chama de alma pode ser considerado, em termos atuais e segundo a perspectiva monista de aspecto dual, uma propriedade emergente dessas capacidades cognitivas que proporcionam a relacionalidade pessoal, com e através da qual o ser humano pode relacionar-se com os outros e com Deus.

Ao mencionarmos o relacionamento com Deus, temos a obrigação de adentrarmos em um tema crucial para a antropologia teológica cristã: a imago Dei. A noção de imago Dei estaria relacionada à ideia de alma, sendo, portanto, a marca da singularidade humana com relação aos outros animais? Primatas se tornaram humanos quando a eles foi concedida a imagem de Deus? A isso nos voltaremos agora. 

O que a teologia clássica chama de alma pode ser considerado, em termos atuais e segundo a perspectiva monista de aspecto dual, uma propriedade emergente dessas capacidades cognitivas que proporcionam a relacionalidade pessoal, com e através da qual o ser humano pode relacionar-se com os outros e com Deus.

A Imagem de Deus

De acordo com a teologia cristã, a noção clássica da singularidade humana advém do fato de que somente os seres humanos foram criados “à imagem de Deus” (Gênesis 1:26). Isso tem sido interpretado de várias maneiras ao longo da história, com diferentes visões teológicas sobre o significado da expressão. Vejamos brevemente algumas delas, conforme sugeriu Van Huyssteen:⁴⁵ 

  • Visão estrutural: a imagem de Deus seria a racionalidade humana – visão defendida por Agostinho, Tomás de Aquino, aceita por Lutero e muitos dos reformadores. Também nessa visão o ser humano possuiría uma “alma”, a qual provavelmente concederia tal racionalidade e capacidades espirituais. Ainda à luz dessa visão, foi sugerida que a Imago Dei também seria a causa de uma distinção física do ser humano (bipedalismo, aspecto geral do corpo, etc.);
 
  • Visão funcional: a imagem de Deus seria o domínio sobre o mundo, noção associada particularmente com Gerhard von Rad (1901-1971). Assim, a Imago Dei não é o que somos, mas o que somos chamados a fazer; 
 
  • Visão relacional: a Imago Dei seria a capacidade de relacionamento com Deus e com outras criaturas – uma ideia desenvolvida por Karl Barth (1886-1968), para quem a imagem de Deus se torna não apenas a capacidade de relacionamento, mas a própria relação: um relacionamento com Deus e uns com os outros, mais claramente exemplificados em Jesus, o qual é plenamente a imagem de Deus.
 

Van Huyssteen também sugere outros caminhos: a abordagem existencial e escatológica da imagem de Deus, encontrada nos escritos de Jurgen Moltmann e Wolfhart Pannenberg (1928-2014). Esses importantes teólogos acreditam que “há uma autotranscedência fundamental que acabará por encontrar sua própria identidade apenas em Jesus Cristo, que cumpre a imagem de Deus em sua totalidade.”⁴⁶

Atualmente, porém, há um certo consenso entre teólogos de que a imagem de Deus combina elementos funcionais e estruturais, mas não é anatômica, genética, neurológica ou comportamental. Para Wright:

A expressão "em nossa imagem" é adverbial (isto é, descreve a maneira que Deus nos criou), não adjetiva (ou seja, como se simplesmente descrevesse uma qualidade que possuímos). A imagem de Deus não é tanto algo que possuímos, mas sim o que somos. Ser humano é ser a Imagem de Deus.⁴⁷

Peter Enns enfatiza a expressão “imagem de Deus” como referente ao papel da humanidade de governar a criação de Deus como seu representante na Terra, relacionando o uso da expressão no Antigo Oriente Próximo: “vemos isso acontecendo no mundo do AOP, onde os reis eram portadores de imagens divinas, representantes designados de Deus na terra”,⁴⁸ e estando fisicamente presentes como estátuas onde o rei não poderia estar.

Pode-se dizer, então, que, no que diz respeito ao que somos — imago Dei —  o que nos torna humanos é justamente esse papel de  representação de Deus na terra, tarefa dada apenas à humanidade. Tal noção traz profundas mudanças na ética, principalmente ambiental, se analisada em conjunto com as noções de Gênesis 2.  Neste capítulo, adam é apresentado como o jardineiro que deve cuidar e cultivar o jardim (Gn 2:15), e que responde ao dono do jardim, o próprio Deus, (diferentemente do adam do capítulo 1, o representante real, que deve dominar como um rei benevolente sobre a criação de Deus). 

Assim sendo, a imagem de Deus na humanidade seria relacionada à função e vocação para com a Criação – representarmos a Deus como ministros e mordomos perante a ordem criada, e não com uma entidade imaterial que possuímos.⁴⁹

Considerações finais

Admitindo-se então que a espécie humana tem sua origem em um longo processo evolutivo em que há cerca de 250 mil anos⁵⁰ uma linhagem de primatas se separou de sua linhagem ancestral e deu origem a nós, como podemos entender a nossa espécie sob o ponto de vista da antropologia teológica de tradição cristã? 

Neste trabalho, abordamos diferentes perspectivas de como definir “humanidade”, desde perspectivas científicas até teológicas. Vimos que a evidência científica aponta para uma unidade corpo-mente, e as propriedades da “alma” são agora identificadas como funções cerebrais. Sugerimos que a “alma” seja vista como um conjunto de habilidades neurocognitivas relacionadas à capacidade humana de relacionalidade, que evoluiu ao longo do tempo.  Ao que parece, essas habilidades não podem ser simplesmente marcadas numa escala de tempo e nem detectadas de forma a singularmente afirmar que “aqui ou ali” é onde primatas se tornaram verdadeiramente pessoas humanas. 

O que queremos concluir, dessa forma, é que, seja o desenvolvimento cultural, a capacidade de relacionalidade que permite que tal desenvolvimento ocorra, ou qualquer outro atributo que julguemos crucial, a “humanidade” – o que distintamente apareceu para que primatas se tornassem pessoas humanas – parece ser uma propriedade emergente do processo evolutivo. Ela – seja como a definirmos – surge a partir de sistemas inferiores ancorados em características do mundo material e de suas leis físicas, mas não pode ser reduzida e plenamente explicada pela soma das partes que compõem esses sistemas. Quando tais características que de alguma forma e em algum nível definem a humanidade foram surgindo, elas próprias agiram sobre os sistemas de níveis inferiores, moldando-os, adaptando-os e configurando-os. 

Obviamente, tal conclusão não tem por pretensão explicar ou esgotar as importantíssimas discussões sobre a natureza do ser humano e sua origem. No entanto, cremos que não há motivos para temer as descobertas das várias áreas da ciência no que diz respeito à antropologia, pois a teologia cristã só tem a enriquecer-se e frutificar por meio da interação com essas empolgantes descobertas.

 

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Agradecimentos do autor:

O autor agradece de forma especial ao Prof. Dr. Justin Barret pelos valiosos insights que contribuíram para este artigo. Também agradece a Fundação John Templeton que através do Projeto Cyral – Ciencia y Religion en America Latina do Ian Ramsey Centre for Science and Religion da Universidade de Oxford proporcionou a discussão do manuscrito inicial no Workshop “O Cérebro, a Mente e a Pessoa Humana” na Universidade Federal da Bahia em Agosto de 2016.

Referências

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* Ensaio classificado em 1º lugar na 1ª Chamada do Radar ABC².

1. CRICK, Francis. The astonishing hypothesis. London: Simon & Schuster, 1994, p. 3. Todas as citações neste artigo são traduções próprias dos originais em inglês, com exceção dos livros já referenciados em português.

2. Também cabe ressaltar que a escolha das fontes que se seguem neste trabalho, e não de outras muitas possíveis, revela-se uma opção obviamente preferencial do autor com relação às contribuições destes autores para a discussão no âmbito do cristianismo evangélico, aquele que é, historicamente, o grupo que mais dificuldades tem tido em suas relações com as ciências naturais, especialmente as biológicas.

3. Por razões de espaço, não adentramos aqui na importante questão de como conciliar uma descrição evolutiva da origem humana com a questão de um Adão e Eva históricos. Para isso, recomendamos efusivamente ALEXANDER, Denis. Criação ou Evolução: precisamos escolher? Trad. Elildo Carvalho Jr. Viçosa, MG: Ultimato, 2017.

4. “Em 1699, Tyson, na primeira descrição da anatomia do chimpanzé, chamou o chimpanzé Homo sylvestris, argumentando que era só a alma que diferenciava este animal de nós mesmos. Buffon, em 1749, escreveu: “Se nosso julgamento fosse limitado apenas à figura [morfologia], reconheço que o macaco pode ser considerado uma variedade da espécie humana”. Linnaeus, em 1732, colocou Homo sapiens na mesma ordem que o chimpanzé (Homo troglodytes), mas Blumenbach e Lamarck colocaram os humanos em uma ordem separada, Bimana, enfatizando nossa dependência no bipedalismo e nas mãos livres para fazer ferramentas.” BROOKS, Alison S. What is a human? Archaeological perspectives on the origins of humanness. In: What Is Our Real Knowledge About the Human Being? M.S. Sorondo (Ed.) Pontificia Academia Scientiarum, Scripta Varia 109, Vatican City, 2007, p.21-35, à p. 21.

5. WOOD, Bernard; LONERGAN, Nicholas. The hominin fossil record: taxa, grades and clades. Journal of Anatomy, v. 212, n. 4, p. 354-376, 2008.

6. Cf. VERNOT, Benjamin; AKEY, Joshua M. Resurrecting Surviving Neandertal Lineages from Modern Human Genomes. Science, v. 343, n. 6174, p. 1017-1021, 2014. Também em SANKARARAMAN, Sriram et al. The genomic landscape of Neanderthal ancestry in present-day humans. Nature, v. 507, n. 7492, p. 354-357, 2014.

7. BROOKS, 2007, p. 22. Morfologicamente, os Homo sapiens se caracterizam por grandes cérebros em relação ao seu tamanho corporal, dentes pequenos, queixos característicos, mínimos sulcos de sobrancelhas, testas verticais, e pela maneira que o rosto é dobrado sob a caixa craniana, trazendo a laringe mais perto da boca para facilitar a fala.

8. Cf. VENEMA, Dennis. Evolution Basics: From Primate to Human, Part 4. Biologos Foundation. 27 Fev, 2014. Acesso em 9 Ago 2016.

9. BERRY, Robert J.; JEEVES, Malcolm. The Nature of Human Nature. Science & Christian Belief, v. 20, n. 1, p. 3-47, 2008, à p.12. A passagem cita MCBREARTY, S. & BROOKS, A.S. The revolution that wasn’t: a new interpretation of the origin of modern human behaviour. Journal of Human Evolution, n. 39, p. 453-563, 2000.

10. BROOKS, 2007, p. 23.

11. AYALA, Francisco J. Human Nature: One Evolutionist’s View. In BROWN, Warren S; MURPHY, Nancey C; MALONY, H. Newton. Whatever happened to the soul? Cambridge: International Society for Science and Religion, 2007 (Primeira edição:  Minneapolis: Fortress Press, 1998, p. 31–48.

12. Ayala considera moral e ética como fundamentalmente a mesma coisa. Cf. JEEVES, 2017, p. 126-127.

13. BROOKS, 2007, p. 23. 

14. Para uma boa análise da questão, com múltiplos exemplos, cf. LALAND, Kevin N.; HOPPITT, William. Do animals have culture? Evolutionary Anthropology: Issues, News, and Reviews, v. 12, n. 3, p. 150-159, 2003.

15. Muitos estudos poderiam ser citados, por ex. RENDELL, Luke; WHITEHEAD, Hal. Culture in Whales and Dolphins. The Behavioral and Brain Sciences, v. 24, n. 2, 2001, p. 309-324.

16. Para uma discussão introdutória sobre esse debate, cf. BERKHOF, Louis. Teologia Sistemática. 1ª Ed. São Paulo: Ed. Cultura Cristã, 1990, reimp. 2000, p. 183-188. 

17. BROWN, Warren S.; JEEVES, Malcolm A. Portraits of human nature: Reconciling neuroscience and Christian anthropology. Science and Christian Belief, v. 11, p. 139–150, 1999, à p. 139.

18. BROWN; JEEVES, 1999, p. 139. 

19. BROWN; JEEVES, 1999, p. 140.

20. Cf. MOREIRA-ALMEIDA, Alexander; ARAUJO, Saulo de F.; CLONINGER, C. Robert. The presentation of the mind-brain problem in leading psychiatry journals. Rev. Bras. Psiquiatr., São Paulo,  v. 40, n. 3, p. 335-342, Epub 01-Fev-2018. Clique aqui para acessar.

21. HOBSON, J.A. Neuroscience and the soul. The dualism of John Carew Eccles, Cerebrum v. 6, p. 61-70, 2004 apud BERRY; JEEVES, 2008, p. 16.

22. MURPHY, Nancey. Physicalism Without Reductionism: Toward a Scientifically, Philosophically, and Theologically Sound Portrait of Human Nature. Zygon, v. 34, n. 4, p. 551-571, 1999, à p. 552.

23. BERRY; JEEVES, 2008, p. 17.

24. Obviamente a discussão do problema mente-corpo é bastante mais ampla do que o apresentado aqui e tem implicações filosóficas, científicas e religiosas diversas. Seria possível abordá-lo sob o prisma de diversas tradições religiosas e diversas escolas filosóficas. Aqui, optamos por elencar textos e autores que dialogam com tradições protestantes mais conservadoras, pois tais tradições costumam ter mais dificuldades em aceitar achados da ciência contemporânea e relacionar com a fé. 

25. JEEVES, Malcom. Mentes, Cérebros, Almas e Deuses: uma conversa sobre fé, psicologia e neurociência. Trad. Djair Dias Filho. Viçosa, MG: Ultimato, 2017, p.70.

26. O grupo de cientistas citado acima se encontrou ao longo de dois anos a fim de discutir estes assuntos para escrever o que veio a ser o premiado livro BROWN, Warren S.; MURPHY, Nancey C.; MALONY, H. Newton. Whatever Happened to the Soul?: Scientific and Theological Portraits of Human Nature. Minneapolis: Fortress Press, 1997. 

27. BROWN; JEEVES, 1999, p. 141.

28. JEEVES, 2017, p. 53.

29. Recomendamos a leitura do livro acima mencionado BROWN, Warren S; MURPHY, Nancey C; MALONY, 2007 (1998), ou da adaptação do livro em artigo em MURPHY, 1999. 

30. Para uma introdução excelente sobre causação top-down, cf. ELLIS, George F.R. Top-Down Causation and the Human Brain. In: MURPHY, Nancey; ELLIS, George F.R. and OCONNOR, Timothy. Downward Causation and the Neurobiology of Free Will. Berlin: Springer Berlin, p. 63-81, 2013.

31. JEEVES, 2017, p. 53. 

32. JEEVES, 2017, p. 54.

33. Este termo tem origem na filosofia moral de R. M. Hare (1919-2002). De forma simples, as propriedades de um tipo F são supervenientes em relação às de outro tipo G, quando as coisas são F em virtude de serem G.

34. BROWN; MURPHY; MALONY, 2007 (1998), p. 222. 

35. BROWN; JEEVES, 1999, p. 142. As visões de Ayala sobre o assunto estão em AYALA, Francisco J. Human Nature: One Evolutionist’s View. In: BROWN; MURPHY; MALONY (Eds.), 1998, p. 31-48.

36. JEEVES, 2017, p. 54.

37. Obviamente, existem outras várias formas de abordar o problema mente-corpo relacionando-o com a questão alma/espírito propostas na literatura de ciência e religião por diversos autores: a “visão constitutiva”, o “dualismo emergente”, o “dualismo holístico”, o “dualismo de substância”, dentre outros. Um texto com uma boa introdução sobre esse debate e referências completas para os defensores de cada posição pode ser encontrado em HUFFMAN, Doug. An Overview of the Monism-Dualism Debate on Human Composition. Biola University Center for Christian Thought / The Table. Clique aqui para acessar. Há também um excelente volume  da série de debates em livro “Counterpoints” que aborda quatro dessas visões: GREEN, Joel B.; PALMER, Stuart L. (Eds), In Search of the Soul: Four Views of the Mind-Body Problem. Downers Grove: InterVarsity Press, 2005; 2nd ed., Eugene, OR: Wipf & Stock, 2010.

38. JEEVES, Malcom. Mentes, Cérebros, p. 88, citando STONE, Lawson, The soul – possession, part or person? The Genesis of human nature in Gn 2:7. In: GREEN, Joel (org.). What about the Soul – Neuroscience and Christian Anthropology. Nashville, Abingdon Press, 2004, pp. 47-62.

39. MURPHY, Nancey. Theology, Science, and Human Nature In: STEWART, Melville Y. (Ed.). Science and Religion in Dialogue, 2 Volume Set. John Wiley & Sons, 2009, p. 744.  Ela faz referência a  DUNN, James. The Theology of Paul the Apostle. Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1998.

40. GREEN, Joel B. What does it mean to be human? In: JEEVES, M.A. (ed.) From Cells to Souls – and Beyond, p. 179-198, 2004; Grand Rapids, MI: Eerdmans apud BERRY; JEEVES, 2008, p. 26.

41. BROWN; JEEVES, 1999, p. 144. 

42. BROWN; JEEVES, 1999, p. 144. 

43. BROWN; JEEVES, 1999, p. 144. 

44. BROWN; JEEVES, 1999, p. 145. 

45. VAN HUYSSTEN, J. Wentzel. Alone in the World? Human Uniqueness in Science and Theology, Grand Rapids, MI: Eerdmans, 2006.

 

46. BERRY; JEEVES, 2008, p. 26.

47. WRIGHT, Chris J.H. Old Testament Ethics for the People of God, Leicester: IVP, 2004, p.119, apud BERRY; JEEVES, 2008, p. 26. 

48. ENNS, Peter. The evolution of Adam: what the Bible does and doesn’t say about human origins. Grand Rapids, MI: Brazos Press, 2012, p. xv.

49. Para mais sobre este chamado ético ambiental e a doutrina da criação, cf. MARLOW, Hilary. The Earth is the Lord’s: A biblical response to environmental issues. Grove Biblical Series. Cambridge: Grove Books Ltd, 2008.

50. Um achado fóssil recente na região de Israel colocou a origem dos humanos anatomicamente modernos um pouco mais para trás do que anteriormente se pensava, bem como sua data de saída da África. Cf. HERSHKOVITZ, Israel et al. The earliest modern humans outside Africa. Science, [s. l.], v. 359, n. 6374, p. 456–459, 26 jan 2018.

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